segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Aforismos (Kafka)

Redação do blog



O caminho verdadeiro segue por sobre uma corda, que não está esticada no alto, mas se estende quase rente ao chão. Parece mais determinada a fazer tropeçar do que a facilitar o trânsito.

A partir de certo ponto não há mais retorno. Esse é o ponto que deve ser alcançado.

O momento decisivo do desenvolvimento humano é perpétuo. Em torno, movimentam-se os espíritos revolucionários, os quais, em verdade, buscam inutilmente de antemão tudo explicar, pois nada definitivo ainda aconteceu.

Leopardos invadem o templo e bebem toda a água da pia de sacrifícios, deixando-a vazia. Isso se repete sempre. Por fim, o evento pode ser previsto e torna-se parte da cerimônia.

Compreender a ventura de que o chão, sobre o qual estás parado, não pode ser maior do que os dois pés que o cobrem.


Com tradução de Silveira de Sousa, esses aforismos são de 28 desaforismos, livro publicado pela Editora da Ufsc e Bernúncia.
Na apresentação do tradutor, ficcionista de ponta, constata-se o porque do neologismo do desaforo, e ainda mais quando se lê Kafka nessa forma mínima, na qual o autor não viu as luzes de sua época, porém as trevas. Se não fosse isso, Kafka não seria o principal representante daquele tempo que respinga no atual, e que Harold Bloom chamou de Era do Caos.
Kafka pensava que não tinha o direito de lutar contra a sua época, porém o direito de representá-la. Se o eu ampliado de Kafka no agonismo da história não podia lutar, é o provisório na consciência que ele negou com a ficção considerada por Jorge Luis Borges como “parte da memória humana”.
Para o escritor argentino que o considerava seu precursor, Kafka é mais importante que nossa época. (J.S.)



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